srta. pequena
3.12.10
2.10.10
paranóia
Tinha essa coisa dentro. Sem forma essa maldição.
Preferia partir nessas horas, mergulhar na delicadeza que é sofrer um surto de realidade.
Só o silêncio poderia preencher essa vontade de ir além.
Saltar pelas telhas escorregadias de uma casa vazia, abandonada dessa alegria cotidiana que persegue o amor como quem bebe a água que jamais sacia.
Preferia as pilhas de papéis mofados, talvez a única e possível testemunha de uma vida tão cheia de futuros esquecidos.
O que seria dela nesses momentos devastadores, de força sem medida? Desabaria sob as cobertas, inventaria seres?
Que energia é essa que nasce da paranóia? Desses olhos que nos acompanham para ler os registros de uma civilização que dura apenas as horas que não nos foram roubadas pela idéia de sobreviver...
Será uma espécie de sabedoria isso que agora pratico?
[Esse desfecho apático e necessário, impessoal demais para ser aceito como fato]
Vamos facilitar os cursos desse rio turbulento – gritavam seus fantasmas politicamente corretos enquanto sua mente saltava em patamares vertiginosos.
Ela tinha essa coisa e tinha vida nisso, dali sopravam os desejos absurdos de não pertencer a nada.
Por menor que fossem as mágoas, ela não as abandonaria.
Porém poucos perceberam a potência incrustada dessa coisa dela.
E por isso ela seguia só, acompanhada dos olhos estranhos de sua paranóia.
o mundo é mau
o mundo é mau, meu filho
pra te esperar na esquina, se esquivar nas macegas da ruazinha
o mundo é feito de gente malvada,
de gente que quer roubar a sua mesada.
esse mundo não é mole mesmo,
ele te suga, te exige, te apressa
e é preciso ser sempre forte e desconfiado.
o mundo é muito pesado.
não fale com estranhos, não pegue carona,
não mexa com bichos, não pegue vento,
não fique gripado
não fique parado
que o mundo vai te deixar pirado
se tentares viver no teu tempo
o tempo está dado
está contado
8 horas de trabalho, 8 horas de sono,
4 de televisão, 4 de qualquer coisa que desligue o teu cérebro
mundo é mau, meu filho
mas eu sou tua garantia
sempre que precisares estarei aqui
virei correndo com meu carro importado
te dizer que enquanto te comportares e aceitares os meus agrados
estarás seguro
19.5.10
dedos verdes e calejados,
cadernos de letras tremidas inspiradas pelos freios da Transol,
o mínino de freios possível para as coisas que são realmente importantes,
ouvidos atentos, olhos fechados,
sapatos rotos
e uma vontade imensa de engolir a música de Vitor Ramil,
que, provavelmente, foi a única que
compreendeu parte dessa tristeza densa que habita as minhas entranhas
e se disfarça de alegria cotidiana.
......................................................
passarim
ai de mim, passarim!
[pra não dizer uma "cagona"]
que tanto corro, atolei no tempo
e quase morro de calma.
que disse: "quero ser outra", continuo querendo ser nada.
eu que tanto assobiava, agora queria cantar um pouquinho.
eu, tu... pensa não, coração!
que esse querer pode ser bonito
e virar canção de ninar.
dorme tranquilo e balança na rede.
.........................................................
30.4.10
o que pode
um navio, um nariz de palhaço, uma risada cicatriz – daquelas que desmonta todo um mundo edificado.
a melhor heterotopia, aquilo que não se previa.
topamo-nos naquele planeta bizarro, fizemos poucas e boas por lá.
a doçura que nunca é tranqüila, nem quando vira gesto.
porque quer sempre existir, refazer-se doce.
corpo querido de incrível curvar-se dentro e fora.
corpo-eterno-desenrolar.
gosto de “puta que pariu! o que eu faço com isso que sinto?”
o “eu te amo” que não quer ser merecido, quer ser nossa capacidade de magia, acordo com aquela gostosa alegria de estar vivo.
simplesmente estar.
o nosso “eu te amo” tem um planeta só dele. ele é corpo que vibra por si.
ele já foi nuvem.
ele é uma potência.
o que pode um “eu te amo”?
eu não sei. mas quero descobrir contigo.
..........................................................................
nós de encontro
teu corpo tem nós de encontro
e são tantos
teu corpo encontra meus nós
e cria nesse encontro um “entre nós” indescritível
impassível de metáfora
teu corpo compõe, funde, faz um novelo de dimensões enroladas
teu corpo-alma é um bom encontro
quando me dissolve nesse vibrar enlouquecido
teu corpo tem tantos nós
que preciso aprender-me para encontrá-los
e esse aprender como ser um “nós”
tem me motivado tanto
teu corpo também tem nós de maus encontros
que eu dissolvo com meus dedos sempre que consigo
nesse incessante apertar de peles e músculos
a gente cria mais de nós do que imaginamos
teu corpo tem pequenas vidas
cheiros, contornos, texturas
que me atravessam em desejos de ser vento, navio e todas essas palavras que vomito
teu corpo-alma é uma infinitude
teu corpo tem sido uma imensidão que eu navego
um emissor de intensidades-pró-poesia
não sei se consigo e nem sei porque preciso descrever teu corpo
descrever é sempre tão difícil
e é ainda pior quando a gente começa as estrofes sempre do mesmo jeito
mas é que... teu corpo...
......................................................................
21.5.09
Acho graça na auto-castração transformada em verbo
que persiste potência,
agindo em pulsar desritmado.
Quanto maior o ato,
maior a potência.
Talvez seja útil brincar de inércia.
Queria implodir
esse acúmulo de futuros que guardo,
ou melhor,
escondo na manga (como se eu tivesse o dom da magia).
Eu tenho mesmo é cara-de-pau, disseram esses dias.
E deve ser verdade.
Porque isso é pré-requisito para cometer um ato.
Acho que cansei de agir, atuar.
Vou ficar parada por um tempo.
Vou desligar algumas coisas.
Vou tentar chorar mais.
É... Não sei mesmo parar.
O movimento sempre me engole primeiro.
A parte e o par
Parte repete
se reparte por par...
Por quê?
Parte pára,
perde o porvir,
se perde por par,
fica à parte.
Parte, sim!
mas não pela praxe,
parte pela arte de pertencer somente ao pó,
de partilhar solidões com gosto.
Não pelo par.
Parte só o que se pensa um,
sem apartar o vazio de não pertencer
além do porto.
Parte ao porto,
não ao par.
Faz paródia,
aponta o paradoxo.
Apura o parto,
faz saltar as vísceras.
Quebra todo o paradigma.
Escancara.
Pára, pára!
Parte para...
Parte nada
Fica só
Fica.
19.4.09
O impulso e o navio
Ainda que te amar seja uma idéia confusa e bizarra,
(como as cambalhotas na areia, que não têm hora ou motivo, simplesmente nascem de um impulso louco e necessário)
sim! É possível enfrentar os medos sem negar a liquidez deste processo de descortinar pele, sentido, rumo.
Fazer desse delírio um elástico,
Como um caminhar há muito torcido, que enfim, vê-se liso e forte.
Impulso.
Meu corpo arremessado numa parede.
Voando,
Dançarei nos fluxos daquilo que não for nosso, meu ou teu.
Mas do que navegar nas possibilidades de nossa existência, sem forma ou referência.
Se haverá a dor da colisão?
Não se trata de construir um mundo.
Muito menos de desprender-se de uma realidade.
Contigo, vejo a potência de um navio,
Conduzido pelos impulsos de um vento de origem desconhecida.
Que passa pelo elástico, mas vem de infinitos pontos.
Um vento não-direcional. Que pode estar contra o elástico e a favor da trajetória.
Que cria o impulso de “sair de mim”, de experimentar lugares feitos de vida sem rosto,
Sem tantos nomes.
É como se nossa verborragia produzisse um silêncio tão calmo,
que a linguagem já não precisa ser um problema.
Porque faz uso da pele, dos cheiros, dos sons.
Porque é vento.
A linguagem entre a gente respira e dança.
E cresce em forma de desejo.
E eu, de cara para o absurdo, vejo-me perdida entre tanta coerência.
É como levar um tapa da vida. Como um bando de vozes rindo de mim.
Dizendo que eu tenho esses medos.
Dizendo: “tu és como todos os outros”.
Tu buscas o belo.
E esta é mais óbvia das provas.
Se eu tenho medo da dor? Se eu acredito na parede?
Eu nem acreditava no impulso.
Pode ser que a parede também seja feita de vento.
Pode ser que a colisão seja só um nome.
O que ainda importa é o prazer de deixar o vento soprar a vela.
a flor de lírio
Cobrará de mim esse mundo a gratidão que eu não sinto? A de ter nascido em bons campos?
Talvez eu prefira ser um pântano, um solo árido.
Ainda que isso faça de mim um ser patético, movido por ânsias, terei de arcar com essa minha cara-de-pau:
Eu decreto meu direito de não ser fértil, de não sustentar nada.
Eu não vivo de plantar e colher.
Só quero decompor o que vive e alimentar o que morre.
Eu não tenho o controle. Não sou controlada pelo prazer. Não corro, não fico parada.
Minha dança é um contorno que se distende e me funde ao meio.
Eu componho movimentos com o brilho dos meus olhos e aquele excesso de contraste que sai do vídeo.
Eu poderia estar fora da tela. Não é o caso.
Posso perder-me, mas o mundo vigia cada passo.
Ele sabe que minha pele resseca quando chega o frio,
Ele enxerga a minha solidão.
E não tenho medo do mundo, mas queria que ele preferisse me ouvir.
O mundo só quer o meu brilho do olho. O mundo me assiste em 100% contraste.
Sou puro Photoshop nesse imenso banco de imagens.
É assim que eles me querem.
É disso que eu falo.
De que vale fazer crescer uma flor mais vermelha que o vermelho em si?
Que estas sementes voem daqui!
Se não for possível sair da tela, que o mundo veja meu pântano, meu deserto.
Porque a minha flor vai deixar de nascer antes de ser um bibelô.
E se quiserem me usar para semear mais brilhos de olho,
Terão de deitar na viscosidade do meu lodo ou queimar a bunda nas minhas dunas.
23.1.09
Descomunicação
O amor, a possibilidade de comunicação mais profunda
Inspira a verborragia
Assim como a solidão,
Quando é possível expressar-se a seres imaginários que nos habitam as angústias.
Porém, há tempos de confusão
Quando não há dor, amor ou ausência
Que façam brotar palavras
Tempos em que a linguagem,
Se surge,
É a fim de ser maltratada
Desperdício de tinta.
Não há sopro que molde poesia
Tudo vira matéria
E o corpo sofre o grito ausente de uma mente muda,
Que abdica da beleza
E a única forma de se sentir vida
É mover-se incessantemente
Pela pulsação sanguínea
Como uma dança frenética
E potencialmente mórbida
15.12.08
bonequinha bruxa
no cabaré.
poderia ser bonequinha de louça, tão moça...
mas não é...”
Faz da tua brincadeira de fugir das cordas
O nó daquelas que seriam “super-n-dimensões” e o escambau
se não fosses tão covarde.
Invade essa tua prepotência, bonequinha!
Cospe esses trapos-sapos,
Respira, e sai dançando
Porque a calma precisa ser mimada
Ou vira paranóia.
Poeira-cordilheira, gata borralheira
venham ajudar-me a escolher as lentilhas.
- os grãos bons no prato, os maus no papo.”
Falta ou excesso de tato?
Poeta ou pateta, de fato?
Quem somos nós, nessa banheira de neblina, nesse transbordar de quereres?
Atiradores de sapato!
13.12.08
SOBRE PELES E DANÇAS
PELE DE MEMÓRIAS, TATUAGEM DE TEMPO
EM SUAS “N” DIMENSÕES, DESENROLA-SE ENTRE AS COISAS PERCEPTÍVEIS E AS MISTERIOSAS, QUE SÓ SE MOSTRAM QUANDO A CHUVA TRAZ O CHEIRO ÚMIDO DA INFÂNCIA OU A AMPLIDÃO DA VARANDA DESCOBRE UM JEITO NOVO DE FAZER MÚSICA.
NÃO. ARQUITETURA NÃO É MÚSICA CONGELADA.
ELA NASCE, VIVE E PERMANECE NA MEMÓRIA EM PROCESSOS DINÂMINOS.
ARQUITETURA É DANÇA.
É A PELE QUE NOS CONDUZ E SE DEIXA CONDUZIR.
É ALGO AO QUAL NOS FUNDIMOS PARA SEGUIR EM MOVIMENTO.
UM CORPO ENVOLTO EM RIGIDEZ, NÃO DANÇA.
Janelas Quebradas
Devaneios sob a consciência de um céu embaçado.
Como a coceira da garganta, o prazer urge mandando mensagens de alerta.
E eu continuo a soltar minhas baforadas, como se o expulsar da fumaça pudesse converter-se em expressão obscena, deleitosa.
Novamente a porta acena em gargalhadas. Ri da minha inocência fajuta. Mostra que quanto mais a bato na cara do tempo, negando suas visitas, mais permito que este invada as frestas das janelas sagradas.
Talvez seja a hora de assumir que o profano das cordas ecoa em presenças mais reais do que eu imaginava.
Ou somente aceitar que o alívio da alma é tão quebradiço quanto imperecível.
Essa realidade suja dos que amam demais.
14.2.08
Farsas
Malditas sejam essas carapaças apaixonáveis que todos almejam.
Pro inferno as roupinhas descoladas e os corpos esculturais.
O conhecimento “pró-status”, a informação gratuita, sem paixão.
Farsa! São todos farsantes.
E quanto tempo se perde amando as maiores farsas...
As pessoas reais somente existem na interação.
Um abraço, um toque, um tapa.
É a vida o que importa, ninguém me prova o contrário.
Pro inferno essas inertes embalagens descartáveis!
Imunda
Sarjeta. Sujeitei-me ao que me foi sugerido: esquecimento.
Sujei o corpo e os pensamentos, sorvendo toda a imundice daquela dor.
Tomada pelos odores mais fétidos, abdiquei de qualquer possível delicadeza. Tal palavra, atualmente, causa-me náuseas.
Deleite agora é lixo.
E de tão podre que estou, já não sinto mais nada.
29.1.08
o ser cacofônico
se já não ser jaz o desejo
sei não
sobre esse, já
já sei!
jazidas de dúvidas?
melhor que seja já
e não
22.1.08
a morte do falso antídoto
que se dizia antídoto,
morre agora por seu próprio veneno,
cujas doses foram minuciosamente calculadas.
Pois que eu não caia sem forças ou morta!
Não haverá mais doença ou intoxicação.
Que o único vício continue música.
morte casual
que porte, o daquela desabante moça,
que tão elegante,
deu com as fuças n'água
sem sequer ter visto a ponte.
situação casual e excitante,
morrer assim,
tão bela, tão jovem.
natural,
feito um passante.
15.1.08
na flauta, saiu um sambinha
na flauta, meu andar prossiga
que de tais contas, tão distantes
eu faça tonta melodia antiga
porque é preciso fazer do canto a saída
perder a pose de mariposa encolhida
tirar do peito essa coisa toda contida
fazer do passo de hoje o sentido pra...
saber que enquanto eu puder cantar
estarei viva
9.1.08
Guinga e Aldir Blanc: absurdo!
O meu amor não é o cais,
Não é o barco.
É o arco da espuma
Que, desfeito, eu sou.
É tudo e coisa nenhuma,
Entre a proa e a bruma, o amor.
É a lembrança que enfuna
Velas na escuna que naufragou.
Não é no livro antigo o olor
De rosa que eu recebi.
Não é a ode, a loa,
Em Fernando Pessoa,
Mas é a nostalgia
Do que eu não li.
Não é camafeu,
Exposto na vitrine, em loja de penhor,
Mas é o que doeu
No peito feito um crime
Ao homem que o trocou.
É o olhar de um instante
Fixando o amante
Em plena traição
Que há em noivas degoladas no caramanchão.
É o vulto de mulher,
Há muito tempo morta,
Em frente à penteadeira.
É o vazio que a
Ausência dela ocupa ao ver sua cadeira.
A chuva dessa tarde trouxe o Tito Madi
E apenas eu ouvia...
Ah, o amor é estar no inferno ao som de Ave Maria!
6.1.08
A solidão me vê
SALA VAZIA
FORMAS LUMINOSAS
ENXERGAR TUDO CINZA
SILÊNCIO
PAPÉIS PERDENDO-SE
EM PILHAS DE NERVOS
NERVOSA
SALA VAZIA
ANTE-ANTI-PROJETOS
DE VIDA
OLHOS CORTADOS
BRUÑEL
OLHOS VAZIOS
ARDENDO
SILÊNCIO E CINZA
OLHOS IMATÉRICOS
RONDANDO
A MALDITA
SALA VAZIA
Um bom momento para ter dito não
Nunca recebi uma carta.
Eu queria a minha duna.
Que vida, que vida.
Que horas são?
Por que não estou dormindo?
Maldita tentação de verborragia.
Será essa a minha doença?
Eu vejo as compensações. Sim, vejo!
Sina perversa.
Comer desejos com farinha.
Pequeno fica o buraco.
Para a maldição de ser feliz.
Só uma boa dose de tristeza me conforta.
Nunca fiz um gol.
Nunca fiz poesia.
Auto-implosão de quereres.
Destruição do nexo.
Simplesmente não existo mais como antes.
Que horas são mesmo?
Ainda dá tempo?
Ou devemos nos contentar com as polidas lacunas?
Não sei mais fazer música.
Nunca fui uma pessoa justa.
Não entendo o prazer do nada,
Mas busco um vazio cotidiano.
Sinto porvires como relíquias.
Ando invertendo os passos,
Dançando com as mãos.
Que noite, que noite.
Desespero de anseios.
Sentenças confusas, obtuso aperto.
Careço de aprendizados.
Queria um pouco da tua angústia.
Que, ao meu ver, é tão calma.
E tão melodiosa.
Remexendo velhos cadernos a gente encontra cada coisa...
lá fora existem novas vidas
outras dores.
é isso!
vamos mudar de dores?
Vamos sair, amor?
esse labirinto está tomado pela neblina
esbarramos contra paredes
porque não temos asas.
Vanos criar asas, amor?
Deixar as dores na névoa
pousar em outra realidade.
Não, amor.
Engana-te ao pensar que podes abandonar as dores
se queres subir e largar teus problemas à névoa
que o faça.
Pois eu, ainda que pouco enxergue,
que me estrepe entre os anteparos,
terei a vantagem do tato
dos olhos vermelhos
dos hematomas.
3.1.08
pontuações
Enche seu mundo de frases soltas
não sabe lidar com pontuações
Excesso de pontos finais? sim! é possível
Talvez má colocação, de vírgulas
É... de fato, é muito complicado saber em que lugar de uma história é possível o uso da vírgula
Mas é inegável que a toda sentença cabe um ponto final.
Mesmo que, com isso, talvez não se atinjam as mais corretas interpretações.
29.12.07
Momentos de Hist
É inventar! É magia!
As palavras engenhosas
E os teus dizeres do dia
À noite não têm sentido
Quando arquiteto a elegia.
E sendo assim continuo
Meu roteiro de silêncio
Minha vida de poesia.
HIST, Hilda. Exercícios, pg 209.
ré
essa maldita fome
de profundidades.
Porque já não cabe aqui
sequer
uma presença.
com vossa licença...
A falança do dia
Camponesa urbana
Mulher de olhos
Intrusos
Ansiosa como as outras
Ela só goza de momentos
Falsa paz, inventada
Vive a poesia dos outros
Abusa de palavras
Plagiadas
Lambusada de pequenos
E bobos
Fatos cotidianos
Deslocada
Cadáver esquisito
Perante o tédio
Instaurado
Regurgita os velhos discursos prosaicos
Conhece-os todos
Abraçar a palavra alheia
Blá, blá, blá
A falança do dia
Fala, criatura! Fala para matar essa maldita carência
Porque a tua saída é única
Esquivar-se por trás desse discurso idiota
Esse papo de antropofagia me cansa
Quero mesmo é voltar para dentro
Da página
Que aqui fora tá muito chato
Quero brincar com aqueles sons inaudíveis
E, com isso
Digerir meus delicados desejos de mudança
Nascimento de uma dor
No verso, faço prosa
Vista grossa ao compasso
E não é essa a nossa bossa?
Bosta de cabeça pensante
Verbo desgovernado
Destronado da velha razão
Cantoria em tempo espremido. Bom.
Desespero de voz
Que escapa, foge
Melodia nascendo
Na fusão das cordas
No momento em que tocas
As do teu instrumento
Como se fossem as da minha garganta.
Encanto findado
Olhos preenchidos
Deixam no tempo
O fruto de um amor criativo.
27.12.07
Vida em conserva
o meu pomar de potes
conserva infâncias melodramáticas
e mentirosa doçura
de tempos em que novelas eram temas das dores
e os amores tinham gosto de suco de guaraná
...e a intensidade de gritos em praia deserta
no inverno
entre memórias conservadas
e ilusões perdidas
tento encontrar os resquícios
daquele néctar
de um viscoso acreditar
que deixei como rastro
e que, talvez
já não volte a expelir
o tempo mora nos meus frutos
no entanto, tenho vivido de conservas
Sumário de neuras
Ela não pensa............01
Ela não pensa............02
Ela pensa que não ama....05
Ela só ama...............04
Ela só ama...............03
Ela mesma................06
Ela ama só...............07
Mas não fica só..........09
Só ela...................11
Ela ama..................12
E só.....................13
Mas nunca só.............08
Ela não..................15
Ela não pensa............16
Ela pensa................17
Ela pensa................25
Ela só pensa.............32
Nela só..................33
Só ela...................??
Decadência
Decadência
Amiga primeira
Ouvindo Garoto
Estendo-me em plácida fraqueza
Duas contas
malvada franqueza
que desencoraja a alma
E desinspira a vida
Solidão de prosseguir
Caminho escuro
Sem verde
Sem contas
Sem olhos
Resido no absurdo
do desperdício
de potencial esquecido
com alma presa
em algum lugar que já não é
seria alguém que não mais clama
porque há nisso um saber
que torna tudo muito complicado
deflagro o vazio
meu
hoje
amanhã estarei melhor
porque não sou poeta
porque não sei sofrer com charme
o meu sofrer é kitsch e não serve de nada.
Pretextos
As palavras me acalmam.
Imitam cantares antigos.
Poesia falsa e ternas falcatruas:
Especialidades da casa.
É simples assim...
Se alma não dança, se expele falada; pura verborragia.
Descompassada, cansada, agora balanço no meu refúgio.
Imagino terras além;
Espero porvires, pretextos, hipertextos inspiradores para esse tempo tão esquisito,
que insiste em parar.
Acabo por desfazer-me dos quereres.
Ando, ando...
Um dia chego a algum lugar.
Quando lá estiver,
volto correndo pra minha rede
pra pensar no assunto.
Sinestésico vazio
Sinestésico vazio.
Goiabada cascão sem queijo.
Comer-te-ia com raiva agora, se pudesse.
Quiçá você existisse.
Maldita assombração!
E agora eu sou a boba.
Menina boba.
Achou que ganhava uma cidade, essa menina.
Nada.
Agora só.
Sinestésico vazio.
Amarras do tempo
PASSOS EM CORDAS, PAUTAS
METICULOSO ANDAMENTO
E A ESPINHA NÃO FICA ERETA
CANSO DAS CONCRETUDES
AMPLITUDE DE VISÕES CONVEXAS
E DE COMPLEXOS CALABOUÇOS
INTERNOS
ABRAÇANDO AS AMARRAS
REVIRO O AVESSO DA PELE
E FURO OLHOS
COM PONTIAGUDOS OBJETOS KITSCH
PEDAÇOS, ESTILHAÇOS
DE MEMÓRIA INVENTADA
Eu, palavra
Estranhos desejos acolchoados em risos, suores e balanço de rede. As melhores palavras não pronunciadas. Elas simplesmente ainda não existem, não foram “convividas”. Drummond me ensina a contemplá-las: “trouxeste a chave?”, sugere. Porém, não sou capaz de ir além. Ainda quero cantar minha cidade, meu pensar, tudo aquilo que em mim insiste em plantar-se... e que ainda não é poesia. Quero agora brincar de ser palavra, pronunciar-me com gosto, gostar de ser solta no ar [kitsch mesmo! Como beijo que enfim se descobre beijo, bocas que enfim se descobrem bocas...]. Quero desvendar tudo isso que é bom e que, de repente, torna-se um mundo. Mundo novo, sem expectativas ou vicissitudes. Novo só. E bonito. Quero o “descortinar" de Clarisse.
Não.
Não é no anseio que mora a inspiração, mas nas lembranças boas. De tais quereres, somente fique aquela morna sensação de olhos que se encontram e se acalmam.
Novamente não.
Melhor voltar a Drummond e tentar conviver com os poemas antes de aventurar-me a escrevê-los.
Ode ao Kitsch
Porque não é amor
Essa coisa pinta os olhos e usa lenços coloridos
Fuma cigarros e faz música como pode
Já não expõe as vísceras
Prefere a angústia de pés gelados
Que vagam por expressões ainda mais kitsch
Que a sua patética rotina
Porque não é verdade
È de praxe demonstrar força e desdém
Reação frente ao invisível do cotidiano
Auto-implosões dicotômicas
Mascaradas em balanço de rede
Porque não é deus
Acredita
Montando na impaciência
Que já deixada de ser escolha, corrói por baixo das unhas
As cordas do instrumento
Procura em notas aquele escasso quê
De nada ser
De nada fazer querer
De si ou de outrem
Fodam-se as portas!
E vem essa ânsia
Puta dor que nem dói direito
Não é dor
Se fosse, emagreceria
É um nó
Um precisar de mais e mais
Falta de balanço de rede
Ronronar de demônios
Sedutores
Algo faz hesitar
diante de tantas portas
Fodam-se as portas!
Chega de olhar para elas!
Se, é para sucumbir ao desejo,
Que seja ao da luz do dia!
Que seja a janela aberta!
A janela
Que é somente uma idéia
A janela é o verdadeiro
Alívio da alma...
O mito da caveira
Parece ocultar algo de belo sua sombra platônica...
Mas eu fui além de sua caverna, caveira!
Vi que não há luz para essa tua ossada sem olhos
Que tua ilusão já é real, cristalizada.
Encontrei certa poesia junto ao teu fenecer diário.
Mas sei que a morte não me alimenta.
E sei também que não suportaria
Compartilhar da tua interminável fome.
Mastiga!
Usa esses dentes!
Eles são o que te resta!
Porque eu tenho língua! E pretendo saborear cada pedaço de mim.
Porque sou gozo, sou vida!
E, ao contrário de ti, tenho dois olhos bem abertos.
Entre Hist e Leminski
Que pureza essa minha
Falta de credo.
Daria o que fosse,
Se já não estivesse tudo posto, dado.
Olha-me de novo, lia a menina boba.
Hist não é para meninas bobas!
Fecha-se o olho por cansaço
É olho, a raiz da aleivosia.
Transfere à pele aquilo que no olho falha.
Vaga por camas estranhas plantando olhares.
Multiplicando a fome.
Doce confusão de afetividades.
Procurando Leminski, diria que,
Essa mania de não perder o centro ainda vai me virar do avesso!
E, quem sabe assim,
Com a carne exposta,
Eu permita irradiar essa luz vermelha que agora me queima as entranhas.
Que já não é
Ponta nos murros meus,
Sou própria faca a mutilar-me.
Sátira mal feita da impotência que me domina.
Desespero holográfico,
Dor refletida em ângulos diversos.
Porta, que virou janela, que já não é. E mal se sabe.
Passadas as explosões de tédio, a vidinha previsível segue em sucessões de pausas.
Com poemas pobres e motivos insignificantes.
Os motivos
Poesia truncada
Palavra não quer fugir
Passa voando, desabando alucinações
E morre.
Auto-implosão por decadência
Hoje, esqueci de vestir as máscaras das múltiplas realidades
Enfiei as garras nos últimos punhados de querer e, como sempre, criei necessidades pequenas.
Preenchi-me de embaraços
Ando desvendando a estranha métrica da desilusão
Faço pouco do erro, nego as mais brilhantes barbaridades
Eu, agora, puramente estado
Aceito o acaso como meta.
Meto a vida num caos de sedução
E danço
Danço com força, presença espantosa
Pavoneio o destino com uma boa gargalhada
Invoco o inesperado com ar de palhaça e desmonto-me em lágrimas de criança
Choro de birra, se me derem um doce, logo paro!
Preciso de vento no rosto
Fiapos vermelhos molhados
Se pudesse, faria musicarquitetura cantada
Mas somente três vezes por semana
Que é pra ter tempo para os motivos
Ah! Os motivos...
São eles que destravam a poesia
home, sweet home
Casulo de mágoas ressecadas
De incontidas projeções inúteis
Paredes que afagam as camadas
De pele fissurada de medo
Casulo, buraco menos falso
Pás-pés-próprios, prontos segredos
Plantadas nos erros das vontades
Pequenas gargalhadas de tédio
The Weather Project, Olafur Eliasson. 2003.
O que faz humana essa carne torta, frente a punhados de hélio e imagens falsas?
Um sol que não é, um ser que não fui e que provavelmente nunca serei.
Beleza construída.
O que me faz chorar diante de um sol de mentira?
O reflexo.
26.12.07
Palhaça de Deus
Aqui estou, meus caros!
Vossa ilustre comedora de frutas
Palhaça de Deus
Não é revolta aquilo que de mim se apossa
Menos ainda ingratidão
É fome!
Pinto a vida com olhos tragicômicos
Elegendo Deus meu ventríloquo
E saindo por aí dançando ao seu gosto
E o pior é que ele ri, o filho da puta!
Nada contra Maria...
Aliás... Salvem as putas!
Elas sim sabem o que fazer na manhã seguinte
Sempre dispostas ao sexo matinal...
Se por uns gordos trocados
Já a mim...
Só restam a sede
E a palhaçada
desentendimento
se é por acaso o que faço,
ou o que assim não mais posso,
já nem me interessa.
que não há portas,
refúgios para uma verdade possível,
estou por desvendar.
no espaço interno procurarei os suportes,
dançarei com os nervos a acalmar os quereres.
entendimento é pura religiosidade.
pois eis que vivo na confusão
e dela tenho me alimentado.
porque ainda busco,
aquele estado intangível.
e, ainda por cima,
tenho a cara-de-pau de fingir que é por pura curiosidade.
Intenções de rio
SE INTENTO, AS ÂNSIAS VAZAM SOBRE AS ASPAS DO TERMO
INCERTO, DESCONEXO
NO ANSEIO, INTENSIONALMENTE DESABO
ADENTRO
ABAIXO DA INFÂMIA SUPORTÁVEL
PROJETO O RIO NO QUAL JOGAREI AS PALAVRAS PURAS DEMAIS
QUE ELE JORRE CLICHÊS DAS VEIAS
SOBRE ESSA CIDADE VAZIA
E EU, AFOGADA
NA CONDIÇÃO DE CORPO SEM ÂNIMOS
HEI DE BOIAR
EM UM MAR AMPLO
SEM LINGUAGENS
Pausa
Não sou somente o que não pareço, mas também despedaço em imagens estúpidas, é fato.
Não desejo um parecer sobre o que sou, posso ou o que já passou.
Ou talvez nunca passe.
Nessas passagens, a vida é tão cheia de parecências, que cansa.
Por isso o momento é de pausa, de vazio.
E não há porque procurar poesia no vazio.
O vazio só é visível pelo lado de dentro.
Por isso somos tão egoístas.
E ainda assim, visão é algo tão traiçoeiro.
O vazio é bom mesmo para imergir-se. E só.
Sem visões, sem palavras.
Pois bem, esvazio-me.
Para uma pausa.
Tombo
TOMBA NA SOLEIRA DA PORTA,
QUE ESCANCARA A ALTURA DO MEDO
E A VASTIDÃO DE UM CHÃO QUE FALTA
CAI COM CERTO DELEITE
SENTE NA ESPINHA A RESISTÊNCIA DO AR,
NÃO A SUA
SUA MENTE ESTÁ CALMA, FUNDE-SE AO NADA
PARA O QUAL DESPENCA
ADENTRA
SEM MAIS DIZERES, É MENTE MUDA
A PARTIR DE AGORA
Sonho Cotidiano
Despida das vestes, envolta nas velhas cobertas
Desligo as luzes do dia
Desisto das imagens dos outros
Imersa no mundo do nada
No mundo palavra, faço-me corpo
Devasso em pensamentos solitários
Deliciosa sensação de escuro
Dançando ao ritmo das sentenças
Como criança embalada
Pelo tic tac à cabeceira
Eis que o dia está prestes
Esse vir a ser de toda manhã me cansa
A idéia de um dia que ainda não está pronto é muito pesada
Pra quem acorda com muito sono
Agarrada até o último fio de sonho
Decido que já é hora de enfiar os pés nas pantufas
Entrego-me ao cheiro do café da madrugada que ainda vem da cozinha
Bom dia! Diz a cozinha vazia
Esqueceste novamente de comprar pão!
Aliás, tens esquecido de tudo um pouco, ultimamente
Saboreando o último pedaço da última maçã da geladeira
Salto pela casa repetindo - em voz alta - a lista de tudo aquilo que esquecerei de levar
Programando afazeres que nunca se concluem, penso que poderia tomar banho frio, vez
Hoje, não tomarei tanto café, não projetarei nada que não possuir um sentido para a minha existência, pensarei um pouco menos nessa maldita existência!
Desligo o Milton do rádio, junto as tralhas e desço a ladeira, curtindo o vento nos cabelos molhados
Bom dia! Dizem todos esses estranhos da rua
Carros enfileirados, pessoas todas doentes, presas nas suas rotinas e esquecendo a poesia
Bom dia! Diz o dia, que ainda não é dia
É mero desfecho da minha falta de vestes sob as cobertas
É sonho cotidiano
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