19.4.09

a flor de lírio

Saí da lira. Esparramei as sementes ao vento. Perdi-me de vista.
Cobrará de mim esse mundo a gratidão que eu não sinto? A de ter nascido em bons campos?
Talvez eu prefira ser um pântano, um solo árido.
Ainda que isso faça de mim um ser patético, movido por ânsias, terei de arcar com essa minha cara-de-pau:
Eu decreto meu direito de não ser fértil, de não sustentar nada.
Eu não vivo de plantar e colher.
Só quero decompor o que vive e alimentar o que morre.
Eu não tenho o controle. Não sou controlada pelo prazer. Não corro, não fico parada.
Minha dança é um contorno que se distende e me funde ao meio.
Eu componho movimentos com o brilho dos meus olhos e aquele excesso de contraste que sai do vídeo.
Eu poderia estar fora da tela. Não é o caso.
Posso perder-me, mas o mundo vigia cada passo.
Ele sabe que minha pele resseca quando chega o frio,
Ele enxerga a minha solidão.
E não tenho medo do mundo, mas queria que ele preferisse me ouvir.
O mundo só quer o meu brilho do olho. O mundo me assiste em 100% contraste.
Sou puro Photoshop nesse imenso banco de imagens.
É assim que eles me querem.
É disso que eu falo.
De que vale fazer crescer uma flor mais vermelha que o vermelho em si?
Que estas sementes voem daqui!
Se não for possível sair da tela, que o mundo veja meu pântano, meu deserto.
Porque a minha flor vai deixar de nascer antes de ser um bibelô.
E se quiserem me usar para semear mais brilhos de olho,
Terão de deitar na viscosidade do meu lodo ou queimar a bunda nas minhas dunas.

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